setembro 26, 2017

Nada, com efeito, ameaça mais a arte do que uma consciência exclusiva de si. Ela deve permanecer indiferente ao seu poder, desatenta em impressionar ou em seduzir, misteriosamente descuidada até mesmo da obra, do mesmo modo que Orfeu relativamente a Eurídice que o segue. É bom que uma disciplina ou uma fé a afaste de sua própria essência, na qual correria o risco de se refugiar, e venha a fornecer-lhe uma coisa diferente de si mesma para amar. Daí, a grandeza das obras religiosas, mais possantes contra o tempo do que os deuses que elas serviam.


Maurice Pinguet, em Digression sur l'art du Japon, encontrado na leitura de Vida e morte da imagem, Régis Debray, pág. 68-69, ed. Vozes, 1994